CityPenha maio 2018
Maio / 2018 - nº 132 10 O que pode explicar uma peça de teatro ficar tanto tempo em cartaz e conseguir se manter engraçada e atual? Uma junção peculiar de um ótimo texto, com a atuação esmerada dos atores e a firmeza da direção que não permite mudanças na montagem? Mas esses são os ingredientes básicos para qualquer peça fazer sucesso, mesmo que por pouco tempo, então qual seria a expli- cação para os 32 anos de sucesso de Trair e Coçar é só Começar? A comédia, escrita por Marcos Caruso, fala sobre uma gran- de confusão causada pela empregada Olímpia, interpretada por Anastácia Custódio, que trabalha para o médico Dr. Eduardo (Carlos Mariano) e sua esposa Inês (Tânia Casttello) e envolve o casal e seus amigos Cristiano e Ligia (Mario Pretini e Car- la Pagani), o síndico (Miguel Bretas) e sua esposa (Siomara Schröder), um vendedor de joias (Ricardo Ciciliano) e um padre (Ernando Tiago), em um emaranhado de suspeitas de traições que não existem, mas que rendem uns trocados para ela e muita risada e diversão para o público. Para tentar descobrir a fórmula mágica desse sucesso apro- veitamos a temporada no Teatro Fernando Torres, no Tatuapé, e fomos conversar com o elenco. CityPenha: Como vocês explicam a peça estar completando 32 anos de sucesso? Porque é tão engraçada? Porque mesmo quem já viu volta para assistir de novo e se diverte tanto, mesmo sendo o mesmo texto? Tânia: O texto em si é realmente fantástico, ele já tem piadas prontas, que vai funcionar de qualquer jeito. A cada 30 segundos tem risada, essa é a matemática do Caruso. Ernando: A estrutura do texto, parece muito com a do stand up. Fui expectador ao longo desses 32 anos, entrei recentemente no elenco e algo que sempre me deixou impressionado foi a es- trutura de dramaturgia do espetáculo, que prepara o público para receber uma piada a cada 30 segundos. Não é um texto longo que a piada vem no fim. É uma atrás da outra por duas horas. O texto é brilhante assim como a direção do José Scavazini, que agora renova um pouco a direção original do Atilio Ricco. A peça não tem cacos, obedece ao texto. Miguel: Como o espetáculo é um entra e sai muito grande, um tumulto geral, dá uma ideia para a plateia que existem cacos e improvisos, mas é justamente o contrário, o espetáculo é cuida- dosamente bem ensaiado. Siomara: E tem que ter essa precisão, porque se não, não vai fun- cionar, e é isso que é genial.Aplateia fica: “Nossa! Nossa! Isso tudo é uma improvisação! ” E não é, pelo contrário, é tudo ensaiado. Carla: O Roberto Pirillo, que interpretou o dr. Eduardo, dizia uma frase que era: “o Trair é uma partitura”. Não adianta você pegar Mozart e mudar alguma nota. Mas o Trair e Coçar é uma partitura que precisa de muito talento para tocar. (risos) Siomara: Isso sem dúvida, nós já vimos atores muito bons en- trando e não conseguindo fazer. A peça tem um ritmo próprio, uma precisão extrema. Mariano: A comédia chega há um ponto que é atrativa para o ator e ele fala: “nossa funcionou tão bem, amanhã eu vou capri- char ainda mais!”. E é aí que fura o olho do gatinho! O trabalho da gente é uma filigrana. Muitas vezes os espetáculos apodre- cem muito rápido por causa do caco, da piada fácil. Ele vai se perdendo. Já faz um bom tempo que achamos o formato ideal e agora são pequenos detalhes que vamos aprimorando, um cuida do outro, isso garante o espetáculo vivo. Miguel: Praticamente toda semana existem ajustes e cuidados que o diretor passa para a gente, porque você tem cenas paralelas, tem cena que passa na biblioteca e em paralelo a outras cenas acontecendo, então você precisa de uma sincronia muito grande. Mariano: Eu e o Mario que estamos há mais tempo no espe- táculo, ele está há 18 anos e eu a 17, e para você ter uma ideia temos que acertar algumas coisinhas, coisas de segundos, isso é eterno. A hora que a gente falar está bom, acabou a peça. Anastácia: Eu acho que o mais difícil em qualquer espetácu- lo é você manter o frescor, manter o espetáculo vivo, como se tivesse estreado agora, e é isso que a gente busca nesses anos todos. Essa coisa do ensaio, do buscar o tempo certo, encon- trar intenções e reações diferentes tornam o espetáculo cada dia mais vivo. A gente entra com frio na barriga. O mais difícil e mais estimulante para gente é fazer o espetáculo que você faz há mais de 10 anos como se fosse seu primeiro dia. CityPenha: Ele não é uma coisa automática? Anastácia: Não, porque senão o espetáculo morre, fica uma re- petição de texto e marcação, e no caso do Trair a gente se diverte em cena, se diverte na coxia, e ensaia diariamente. Ricardo: Aqui quando chega alguém novo, ele é imensamente acolhido. Tem a direção, mas também tem o cuidado do ator que está há 17 anos, que vem e puxa, dá conselhos. Existe um grande cuidado interno entre todo o elenco. Carla: Temos inclusive a nossa camareira Zazá, que está há 25 anos na peça, que ri diariamente na coxia, que sabe a fala de todos, que comenta a atuação de cada um e interage com a gente para ajudar a melhorar. Ricardo: Teve um fato recente, encrencou a porta da bibliote- ca e aí vem o improviso e muito rapidamente o Mariano virou para a Nana e disse, faz o seguinte não existe mais essa porta e todo mundo passou a pular a muretinha como se ali fosse a porta. O público percebe que está acontecendo algo diferente, e que a gente abraça a história. CityPenha: E vocês sabem que se acontecer uma dessa, a equi- pe vai segurar a onda. Trair e Coçar é só Começar A Longevidade de um sucesso C apa
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