capa121 - page 24

Junho / 2017 - nº 121
24
Estava ofegante, o coração acelerado, suas passadas
eram rápidas conforme permitiam a neve e o relevo ir-
regular. As explosões e os tiros do inimigo ficaram para
trás. Passava das 16:00 horas e Mário Luiz estava perdi-
do. Sua patrulha se separara após ter sido surpreendida
por uma patrulha alemã. Dezembro de 1944, frio inten-
so. Mário Luiz era Pracinha da Força Expedicionária
Brasileira e integrava o 1º Regimento de Infantaria da
1ª Divisão de Infantaria Expedicionária (1ª DIE). Tinha
1,67 metro de altura, pela morena clara, cabelos pretos,
bigode e uma marca de nascença na face direita do rosto
que se assemelhava à uma tâmara.
Naquele dia de dezembro fora destacado com mais
três pracinhas para uma patrulha próxima às linhas ale-
mãs que estavam no Monte Belvedere, na Itália. O Cabo,
comandante da patrulha, não inspirava muita confiança
no trato de mapas e bússola e a acabou levando além
dos limites seguros dos Aliados; quando foram atacados.
Na floresta seguiu em direção oeste achando que lá
encontraria seu Regimento. A neve dificultava a cami-
nhada encobrindo buracos e pedras que o faziam se de-
sequilibrar e cair. Pisou em falso e rolou alguns metros
para baixo, caindo sentado sobre a neve numa pequena
clareira. Seu capacete uns dois metros à direita e sua ca-
rabina M-1, à esquerda, enganchada numa moita. Ainda
sentado, olha para cima e vê, uns seis metros à sua frente,
um soldado alemão, com seu casaco camuflado branco,
apontando-lhe sua pistola Luger P08. Ficou atônito es-
perando o disparo do inimigo e, assim, o fim de sua vida.
Segundos se passaram e não houve disparo algum.
Mário Luiz fitou o alemão nos olhos. Usava quepe, de-
veria ser oficial, pensou. Tinha aproximadamente 1,90 m
de altura, olhos azuis penetrantes, cabelos louros, rosto
grande e queixo
quadrado e
na face
esquerda uma cicatriz horizontal, saindo da base do olho
até a orelha da qual faltava a parte superior.
O alemão não atirou. Após olhar com atenção para
Mário Luiz, com sua mão esquerda fez um gesto de si-
lêncio para ele e apontou seu dedo na direção do ombro
de Mário indicando a Bandeira do Brasil. Após, apontou
para a direção sul e fez um gesto para que se dirigisse
para lá; também por gestos, indicou que ele iria para a
direção norte e que era para Mário aguardar sua retirada
dali. Mário Luiz entendeu tudo. O alemão se afastou de
frente para ele e adentrou à floresta novamente. Mário
esperou uns 10 minutos sem se mexer. Sentindo que era
seguro se levantou, pegou o capacete e a carabina e se-
guiu para a direção indicada, sem nada entender. Após
uma hora de caminhada chegou até suas linhas onde sou-
be que o Cabo e outro pracinha também chegaram, mas,
um terceiro fora feito prisioneiro.
Hans Fischer era Tenente do 2º Batalhão do Regi-
mento 1.043 da 232ª Divisão de Infantaria Alemã. A
função dessa Divisão era manter uma linha de defesa
que ia do Monte Belvedere até o Monte Della Torraccia,
passando pelo Monte Castelo, impedindo o avanço das
Forças Aliadas. Ele, todos os dias caminhava pelas li-
nhas sob responsabilidade de seu batalhão verificando as
condições da tropa e dos equipamentos, transmitindo um
relatório da situação ao Quartel-general.
Naquele dia de dezembro Hans estava cumprindo sua
obrigação quando ouviu um barulho no terreno acima de
sua posição e, em seguida, viu um corpo rolando espa-
lhando capacete e carabina pela clareira. De imediato sa-
cou sua arma. Viu o soldado aliado cair sentado, pensou
em atirar, mas uma coisa lhe chamou atenção: a Bandeira
do Brasil no casaco do soldado. Nunca vira um brasilei-
ro antes! Lembrou que tinha parentes distantes no Bra-
sil. Percebeu que o aliado tinha uma mancha no rosto.
Pensou um pouco, sua Luger apontada para o soldado.
Entendeu que ele estava perdido. Então pediu silêncio e
indicou a direção de suas linhas e que também se retiraria
dali e, após, ele deveria ir embora.
Nem Hans, nem Mário contaram essa passagem para
alguém na época ou mesmo depois.
A guerra acabou e os Pracinhas retornaram para o
Brasil. Mário Luiz voltou para São Paulo. Concluiu o
“colegial” e conseguiu emprego num banco. Fez uma
bela carreira, inclusive concluindo curso superior. Casou
e teve filhos.
Para Hans Fischer, após o término da guerra, a sorte
foi outra. Passou seis meses num campo de prisioneiros
americano e, após ser libertado retornou para sua cida-
de natal que, para sua infelicidade, ficava na parte da
Artesanato e Lembranças
C
onto
1...,14,15,16,17,18,19,20,21,22,23 25,26,27,28,29,30,31,32,33,34,...68
Powered by FlippingBook