CityPenha maio 2015 - page 30

Maio / 2015 - nº 96
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“Você já foi à Bahia, nego? Então vá!”
Essa frase extraída de uma composição dos anos 40, mos-
trava bem a importância de se cantar as belezas naturais do
Brasil livres, ainda, dos ufanismos característicos do período
da ditadura militar que viria nos anos 70. Era, na verdade, uma
apologia ao Brasil e que tanto contribuiria para o cenário mu-
sical nacional que perdura até nossos dias. Importante frisar
que essa composição como tantas serviria para despertar a
curiosidade de muitos brasileiros para conhecerem e conferi-
rem de perto aquelas belezas tantas cantadas e divulgadas nas
rádios e posteriormente na televisão de nosso país.
Se pensarmos que a Bahia seria alvo de muitas canções,
teremos que lembrar outras obras que citavam, por exemplo:
“vou-me embora, vou-me embora prenda minha, tenho muito
que fazer...” mencionando expressões tipicamente sulistas e
que acabariam contagiando todos os demais rincões brasilei-
ros, sendo cantadas até mesmo por muitos que nem imagina-
vam que o termo “prenda” designa até hoje uma garota amada!
Nem precisamos citar a apoteótica Aquarela do Brasil que
para muitos (não tanto para mim) deveria ser o verdadeiro
Hino Nacional! E o famoso trem que imortalizaria um bair-
ro de São Paulo e que sempre tem que ser apresentada pelos
Demônios da Garoa que todos esses anos depois jamais se
permite desembarcar do Trem das Onze e isso sem deixar de
mencionar o tempo dos Lampiões de Gás igualmente imorta-
lizado na voz saudosa de Inezita Barroso.
Dentre as cidades homenageadas pelos compositores, o
Rio de Janeiro continuou lindo mesmo com o fusca deixando
as linhas de montagens há anos afinal, a Cidade Maravilhosa e
que era (era?) o “coração do meu Brasil” perpetuaria ummodo
de vida tipicamente brasileiro com suas praias e as mulatas
“gingadeiras” além, claro, do jeitinho carioca de encarar di-
versas situações. E o que dizer das regiões campesinas do Bra-
sil lembradas todas por um tema de abertura de uma novela
– O Rei do Gado, que viria depois da inesquecível Disparada?
Os mais vividos certamente se recordarão de uma série de
“gingles” comerciais da antiga VARIG sobre as regiões em
que suas asas chegavam. Pérolas como a aquela que falava
do Ceará ou então do Recife eram mostradas sob a forma de
desenhos animados com o garoto propaganda da companhia –
um simpático Tucano que se misturava aos costumes de cada
região desse imenso país.
Verdade é que anos depois da Aquarela do Brasil inundar
as paradas de sucesso e os programas de auditório de então,
nos anos 70 um outro samba revelaria uma novaAquarela ma-
ravilhosamente entoada por Martinho da Vila. E sem querer
fazer mais apologia, a Bahia mostraria muitas facetas com
uma Tarde em Itapoã.
Na esteira do mundo sertanejo tradicional, muitas locali-
dades situadas entre Goiás e Mato Grosso (quando ainda não
havia a divisão entre ele e o seu irmão do Sul) serviam de pano
de fundo para suas canções, isso antes do ritmo ter-se desviado
inteiramente para o chamado sertanejo universitário que nada
mais é do que um pop com sanfona.
Vejam como as mais diversas localidades desse Brasil
serviram a tantas inspirações para serem cantadas em verso
e prosa das mais diferentes maneiras possíveis e imagináveis.
Mas, o que se esconde por trás disso tudo e o que a Geografia
tem a ver com esse tema?
Fácil! Graças a ela, a Geografia, foi possível dar-se vida a
tantas canções e interpretações e, por que não, fustigar a curio-
sidade de tantos turistas que desejaram checar pessoalmente
se aquelas belezas cantadas eram de fato reais? Felizmente,
por mais que se esforçassem e se esforcem os poetas de plan-
tão, dificilmente conseguirão retratar com fidelidade o que
cada região guarda para nos mostrar.
O arsenal de belezas e riquezas naturais brasileiras é ines-
gotável e só podemos lamentar que o momento pelo qual a
música brasileira passa, isento de qualquer criatividade, não se
atente a esse tesouro para explorá-lo de forma mais adequada.
Pouco se disse acerca de Fernando de Noronha ou de Canela
ou ainda, da Chapada Diamantina. Elas estão lá, esperando
para serem observadas e transpostas para o cancioneiro de
nosso país.
E nessa busca incessante por se descobrir o novo para tentar
imortalizá-lo, quem sabe algum compositor, em algum tempo
ainda tentará deixar de lado o Cristo Redentor para se prender,
por exemplo ao Véu da Noiva, um dos locais mais deslumbran-
tes do Rio de Janeiro. Ou então, ver que além de badalação,
Campos de Jordão esconde uma serra das mais deslumbrantes
do Estado de São Paulo. Bahia? Ela vai muito além do Pelouri-
nho e da praia de Itapoã, assim como Pernambuco é mais que a
“Veneza brasileira” da mesma forma que as praias de Fortaleza
ultrapassam a fronteira da Volta da Iracema.
Brasil, um Brasil bem brasileiro espera que cada um de
nós, travestido de Descobridor dos Sete Mares, possa andar
pelos campos, praias, montanhas e planícies que nos perten-
cem e se surpreender com tanta beleza. Veremos sim que além
das canções existe muito a ser visto. Pense a esse respeito e, se
tiver um tempinho, abra um desses atlas geográfi-
cos para escolher seu próximo destino. Leve, cla-
ro, uma boa máquina fotográfica ou mesmo seu
celular e depois, apresente orgulhoso o resultado
disso tudo e, se possível, embalado por uma ou
várias canções que comporão sua trilha sonora!
Bruno Saike
• músico e vocalista da Banda He Saike
A geografia na música
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