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Novembro / 2016 - nº 114
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O
pinião
Por Rodrigo Teixeira - site
Existem sete pecados capitais na bíblia: gula, avareza, lu-
xúria, ira, inveja, preguiça e soberba. No Brasil, e em diver-
sos países do mundo, existem oito, basta acrescentar a riqueza
à lista. Sim, embora ninguém goste de assumir, ter dinheiro
em um mundo com desigualdades é motivo de vergonha para
quem tem, e raiva para quem quer ter. A vergonha de ser rico e
a vergonha de ter dinheiro existem desde que o mundo é mun-
do, mas o constrangimento aumenta na mesma proporção que
as conexões e antenas de celular são erguidas fronteira afora.
Antes da agricultura nossa sociedade era baseada na caça
e na coleta, e funcionávamos de forma cooperativista, onde os
recursos e os esforços eram divididos. Naquela época o dife-
rencial era a força, e não a riqueza.
Vergonha de ser rico: A origem
A fartura surgiu junto com a agricultura, a partir do mo-
mento que uma pessoa passou a produzir mais alimentos que
a outra. Em uma sociedade onde não existia dinheiro, ter mais
comida que os outros fazia daquela pessoa alguém mais im-
portante, o que aumentava sua importância na sociedade e seu
apelo entre as mulheres. Sendo assim, ser rico era bom, e ser
pobre era ruim.
Segundo o livro de Simon Shama, “A vergonha da Rique-
za – Uma interpretação da cultura holandesa durante a era de
ouro“, durante o século 17, a Holanda viveu um período extre-
mo de riqueza, e os burgueses da região prosperaram como nun-
ca. Naquela época a nobreza comprou vasos Ming e tapeçarias
importadas, e os trabalhadores do país, mesmo os mais pobres,
eram melhores alimentados do que seus pares em outros paí-
ses. Mesmo assim, em um país extremamente religioso, havia a
vergonha e o medo de punição pelo “excesso da abundância”.
Essa mesma vergonha prevalece nos dias de hoje. Quando
os amiguinhos de uma criança descobrem que seu pai tem um
carro importado, elas o chamam de riquinho e filhinho de papai.
Como mecanismo de auto-defesa, a criança tenta justificar a ri-
queza do pai. Não, ele não é rico, ele é de classe média. Quem
tem dinheiro não é ele, e sim seu pai. Os pais não ensinam as
crianças a responder que sim, seus pais têm mesmo uma con-
dição financeira melhor, mas aquilo se deve ao trabalho duro e
ao estudo. Sim, ele é rico, mas o que ele pode fazer a respeito?
Segundo o governo brasileiro, uma família que ganha em
torno de R$ 1.746 por mês é considerado classe média baixa.
Ou seja, alguém que volta para casa com meio salário míni-
mo no final do mês é classe média. Uma família de alta classe
alta, ou seja, a elite da elite, ganha em torno de R$ 9.920 por
mês. Pergunte alguém com renda de R$ 1.500 se ele é de classe
média, e ele vai dizer que não, que ele é pobre, e alguém que
ganhe dez mil reais por mês não dirá ser rico. No máximo,
classe média alta.
Quer fazer um teste se você ou se um amigo seu tem ver-
gonha da riqueza? Elogie o carro ou apartamento novo dele.
Na maioria das vezes a resposta será um “gostou? Comprei
financiado” ou “ah, mas é usado”, ou então “é, to ferrado para
pagar”. Ninguém responde que sim, o carro é novo, mas que
ele ou ela trabalha muito pagar o boleto no final do mês. No
Brasil há a cultura do coitadismo, é muito mais bonito perten-
cer à classe sofredora do que à classe dos remediados, como
diria minha avó.
Em todo lugar há a vergonha de ser rico, mas o Brasil é um
dos poucos lugares onde ser pobre é motivo de orgulho. Vejam
que para a sociedade não é o dinheiro que é ruim, e sim o fato
de alguém tê-lo, e não você. Se o brasileiro se preocupasse me-
nos com a riqueza que os outros tem, e se preocupasse mais em
tentar obter aquela mesma situação para ele, talvez fossemos
um país melhor. Isso e o fim da corrupção, claro.
Há no Brasil um fenômeno social e econômico chamado de
cultura do coitadismo. Em terras brasilianas, da mesma forma
que é feio ter dinheiro, é um atributo quase que sexual criticar
os mais privilegiados e detentores do capital, mesmo que isso
seja feito de um apartamento no Leblon e através de um Ma-
cbook que custa três meses do salário de um trabalhador. É o
que chamamos de esquerda caviar, o paladino da justiça digital.
Existe uma diferença brutal entre combater a injustiça e a
desigualdade ou somente comentar esse fato. Aúnica coisa que
acaba com a pobreza é a universalização da educação e a distri-
buição de riqueza, mas só é possível distribuir algo que existe.
Por mais que a esquerda tente acreditar que sim, infelizmente
o dinheiro não dá em árvore, e sim a partir de muito trabalho.
Quem ganha salário não fica rico. Esta foi uma das primei-
ras lições sobre economia que aprendi de um ex-chefe meu. O
Brasil só vai virar um país rico quando o emprego público dei-
xar de ser um sonho de consumo. Quando o empreendedoris-
mo virar algo tão atrativo sexualmente quanto a verbologia do
paladino das redes sociais. Mas em um país onde empresário
é ladrão, vagabundo e egoísta, quem é que vai querer arriscar
abrir uma empresa, quando é mais fácil sentar em uma cadeira
com rodinhas e mamar nas tetas do governo?
Resumindo: No Brasil é assim, dinheiro na mão é venda-
val, mas quando ele está na mão dos outros, ai é pecado, e é
assim que você deve se sentir quando sua conta fica positiva no
final do mês se você mora em terras Tupiniquins.
O brasileiro e a vergonha de ser rico
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